A Igreja e as multidões – I | Paulus Editora

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Igreja e Sociedade

21/08/2013

A Igreja e as multidões – I

Por Valdecir Luiz Cordeiro

As manifestações do mês de junho são portadoras de insatisfações e sonhos. Qual deverá ser o posicionamento dos cidadãos cristãos, ou seja a Igreja, diante das multidões que desfraldam nas ruas as mais variadas bandeiras reivindicatórias? Um realismo esperançoso, capaz de engajar as pessoas com eficácia, para além de visões catastrofistas e otimismos ingênuos, poderá indicar o caminho. Jesus e Nazaré lidou com as multidões. Talvez possamos aprender com ele.

Jesus atraia as multidões em torno de si. O evangelista Marcos (Mc 6,31) diz que, em determinada situação, era tanta gente, que Jesus e os discípulos não tinham tempo nem de comer. Vejamos, pois, as características dessas multidões e as atitudes de Jesus e dos discípulos para com elas.

1. Multifacetadas e insatisfeitas com a situação social. Multidões formadas por gente de todos os tipos, majoritariamente pobres, doentes, aleijados e pecadores públicos, que eram pessoas manjadas socialmente e excluídas pelo poder religioso e político da época. Apareciam também outros tipos humanos, como o rico Zaqueu e Mateus, o cobrador de impostos, bem como pessoas estrangeiras.

As multidões eram portadoras de certa insatisfação com a situação social. Ignoradas pelas autoridades, viam no profeta de Nazaré um raio de esperança. Buscavam a solução de problemas individuais, como a doença ou a fome. Jesus procura alargar o horizonte da busca: convertei-vos e crede na boa notícia do Reino (Mc 1,14).

2. Grupamentos de massa, como os atuais. A maioria das pessoas não calculava o preço que cada um teria de pagar para que o entusiasmo com a pessoa e a mensagem de Jesus tivessem consequências práticas na vida.

De fato, poucas vezes os milagres realizados por Jesus culminaram no compromisso com a boa notícia do Reino. Somente vez ou outra alguém se propôs a seguir Jesus após ser curado. O mais comum era a dispersão das multidões, após os arroubos de entusiasmo. No fim, a atitude de indiferença tomava conta das pessoas. Acabava predominando a quase implacável lei do menor esforço. A tendência era transferir toda a responsabilidade a Jesus, como quando, sem sucesso, quiseram fazê-lo rei, após a multiplicação dos pães. Um pouco como hoje. Muitos vão para as ruas, mas poucos querem compromisso pessoal.

3. Portadoras de minorias qualitativas. Malgrado suas tendências massivas, as multidões abrigavam pessoas dispostas a seguir Jesus e a defender suas ideias. Eram grupos pequenos, como o dos discípulos. A eles Jesus explicava pormenorizadamente os mistérios do Reino. Assim, formou um grupo comprometido e preparado para enfrenar os maiores desafios. Os discípulos e discípulas formaram comunidades, a Igreja, e deram testemunho de perseverança diante das perseguições, criatividade frente aos desafios históricos e sabedoria para enfrentar as manipulações dos poderosos da época. Quando a situação o exigiu, muitos foram até às últimas consequências, entregando a própria vida, a exemplo de Jesus Cristo.

As feições das multidões e a forma como Jesus lidava com elas são claros indicativos de como podemos nos situar hoje, como Igreja, diante das atuais manifestações.

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