O primeiro presépio: escola de sobriedade e alegria | Paulus Editora

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Igreja e Sociedade

22/12/2023

O primeiro presépio: escola de sobriedade e alegria

Por Cleane Santos

Celebrar a natividade de Jesus Cristo, que fez morada entre os homens, é contemplar a humildade de um Deus apaixonado pela humanidade e que se revelou por meio do mistério da encarnação. Desde o anúncio da Boa Notícia, pessoas em diversas partes do mundo reúnem-se para festejar o Natal.

Muitos comemoram com alegria o Natal do Senhor, reúnem-se em família para simples ou fartos banquetes, enfeitam suas casas com luzes multicoloridas, árvores de Natal e presentes. Além disso, como parte da decoração, introduzem diversos símbolos tradicionais e históricos do momento, como a figura do Papai Noel e tantos outros aparatos que, em suas concepções, deixam seus lares aparentemente mais acolhedores e imersos no chamado “espírito natalino”. Entretanto, a fé da Igreja católica, por meio do Advento (tempo vivido em preparação para a celebração do Natal), nos convida a interiorizar e adotar, a cada ano, uma espiritualidade autêntica que revela o verdadeiro sentido do Natal: contemplar a encarnação do Verbo de Deus, que se tornou humano. 

Entre as várias formas de recordar esse momento histórico, encontramos o “presépio”, do latim praesepium, que, em sua essência simbólica e representativa, nos leva diretamente ao cenário evangélico no qual se narra o nascimento do Filho de Deus na cidade de Belém, sobretudo a forma como Ele veio ao mundo, despojado de qualquer realeza e numa simplicidade que confunde e impressiona, até hoje, os ricos e poderosos. 

No último dia 20 de dezembro, em audiência geral, o papa Francisco convidou o mundo a redescobrir as origens do presépio. Neste ano de 2023, celebram-se 800 anos do primeiro presépio montado por São Francisco de Assis (1181-1226), no ano de 1223, numa cidadezinha da Itália chamada Greccio.

Foi São Francisco que teve a ideia de representar a forma como o Menino Jesus veio ao mundo: nascido com simplicidade, o Filho do Altíssimo deitou-se sobre as palhas de uma manjedoura, entre os animais, junto a Maria, sua Mãe Santíssima, e o guardião da Sagrada Família, o bondoso São José. Com tamanha inspiração divina, foi dessa maneira que o Santo de Assis iniciou no mundo uma bonita e significativa tradição: o presépio. 

O Santo Padre recordou que São Francisco desejava representar o Menino nascido em Belém e, de certo modo, mostrar as dificuldades enfrentadas por Maria e José devido à falta de coisas necessárias e devidas para acolher um recém-nascido.

Conforme narra a Sagrada Escritura, não havia lugar para o Menino Jesus nascer, a cidade estava superlotada e nem sequer havia uma cama para ele reclinar a sua cabeça. Jesus, Maria e José estavam amparados somente pelas mãos de Deus. Pensemos um pouco: para o nascimento de um “Rei”, estima-se uma grande preparação com festa, banquetes, convidados e os melhores aposentos, certamente um evento grandioso, com uma recepção regada de conforto e muita fartura. Mas não foi assim, Jesus nasceu numa gruta, onde os animais se alimentavam e dormiam, sem luxo algum.

Neste caminho, o primeiro presépio criado por São Francisco tinha por objetivo transmitir a humildade e simplicidade que o Senhor Jesus nos ensina. Segundo o Santo Padre, os cristãos precisam exercitar a admiração pelo presépio, o que exige um esforço para olhar além das interpretações rotineiras e anuais.

“Se nós, cristãos, fitarmos o presépio como uma coisa bonita, como algo histórico, até religioso, e rezarmos, não é suficiente. Perante o mistério da encarnação do Verbo, diante do nascimento de Jesus, precisamos desta atitude religiosa da admiração. Se, diante dos mistérios, eu não tiver esta admiração, a minha fé será simplesmente superficial; uma fé ‘virtual’. Não o esqueçais”, enfatiza Francisco.

Para o Santo Padre, devemos estar atentos para não nos deixarmos envolver pelo consumismo desenfreado e esquecer-se de contemplar a mensagem do presépio e o significado do Natal, conforme um dia idealizado por São Francisco de Assis. O papa ainda enfatiza que, a partir do presépio de Greccio, temos uma escola de sobriedade e alegria. “Olhemos para o presépio: o enlevo diante do presépio. Às vezes, não há espaço interior para a admiração, mas apenas para organizar as festividades, para fazer festa”, diz.

Em sua catequese, papa Francisco nos ensina que o presépio nasce para lembrar-nos que Deus vem habitar no meio de nós. Nessa perspectiva, ao contemplarmos o presépio somos conduzidos a pensar nas relações sociais de Jesus naquele momento, que integram sua família, isto é, Maria e José, e os entes queridos, os pastores, estes últimos sendo os primeiros a saberem do nascimento de Jesus. Assim, somos levados a priorizar as relações humanas e, de modo especial, as pessoas que fazem parte do nosso cotidiano.

Diante do presépio de Greccio, aprendemos que, além da sobriedade, devemos alegrar-nos com o Natal do Senhor. Francisco fala-nos de uma alegria verdadeira, não uma alegria artificial. “De fato, o presépio é como um Evangelho vivo que transborda das páginas das Sagradas Escrituras. Ao mesmo tempo que contemplamos a representação do Natal, somos convidados a nos colocar espiritualmente a caminho” (Admirabile Signum, n. 1).

Logo, contemplar o presépio é anunciar a simplicidade com que Jesus veio ao mundo. Com o presépio, é possível refletir com detalhes sobre o grande acontecimento: O céu estrelado e a noite escura, que nos revelam que Deus não nos deixa sozinhos em meio aos desafios da vida; a estrela de Belém, um sinal que nos coloca de pé, para ensinar-nos a estar sempre a caminho em direção à gruta para adorar o Menino Jesus, assim como os pastores de Belém. Também a imagem do anjo que anuncia a chegada do Messias, junto a uma faixa com a mensagem: Gloria in excelsis Deo (“Glória a Deus nas alturas”). 

Na sequência, Maria Santíssima, que nos ensina com seu testemunho a dar o nosso “sim” diariamente a Deus, além de contemplá-lo. São José, o guardião da Família de Nazaré e primeiro educador terreno do Filho de Deus. Por fim, o Menino Jesus, no qual Deus manifesta o seu amor pela humanidade e nos conduz à salvação. 

Em mais um Natal, que possamos acolher o Menino Jesus e adorá-lo em sua real simplicidade, assim ensina São Francisco de Assis e como os três Reis Magos que lhe ofereceram ouro, incenso e mirra. Chega o Natal e junto a Boa Notícia de paz, amor e alegria para os homens da terra. Silenciem-se as armas, desarmem todos os corações, pois nasceu o Salvador.

 

 

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