Memória dos fiéis defuntos: Morte, fé e a esperança cristã | Paulus Editora

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Igreja e Sociedade

26/10/2023

Memória dos fiéis defuntos: Morte, fé e a esperança cristã

Por Cleane Santos

Em 2 de novembro, a liturgia da Igreja Católica celebra o dia de todos os fiéis defuntos. Na ocasião, os cristãos são chamados a rezar pelos falecidos na esperança da ressurreição em Cristo Jesus. A presente data é marcada pelo silêncio, memórias e a saudade das pessoas que já realizaram a sua Páscoa. Além disso, a ocasião sugere uma reflexão acerca do sentido da vida e da morte. 

Ao celebrar esta liturgia, recorda-se também da vulnerabilidade humana e a importância de valorizar as pessoas em vida e, sobretudo, rezar pelas almas que já partiram. Embora o mistério da morte assombre a mente de milhares de pessoas ao redor do mundo, acompanhada pelo sentimento de dor, sofrimento, angústia e saudades de quem se ama, somos convidados a crer em Deus, em seu Filho Jesus Cristo e no Espírito Santo que, em sua totalidade divinal, preparam um lugar à mesa para todos os seus eleitos, conforme as promessas de Jesus descritas na Sagrada Escritura – “Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fosse, eu lhes teria dito; porque vou preparar um lugar para vocês. E quando eu for e tudo estiver preparado, voltarei e levarei vocês comigo, para que vocês também estejam onde eu estiver”. (Jo 14, 1-3). 

Na obra “Eu creio na vida eterna”, publicada pela PAULUS Editora, o cardeal Carlo Maria Martini (1927-2012) medita sobre os temas que entrelaçam a discussão sobre o término da vida terrena, sobre o julgamento final e o destino que espera toda a criatura humana. No prefácio do livro, o crítico literário Giuliano Vigini, ao refletir sobre a publicação, especialmente sobre o medo da morte vivenciado por muitos, irá dizer que esse medo é tido como um instinto que não se elimina, mas não deve transformar-se em angústia, verdadeira forma de escravidão que paralisa a mente e o coração.

Vencer o medo da morte é o primeiro passo, mas nos iludimos se pensarmos que isso pode ser feito confiando nas próprias forças, nas realidades muito frágeis. O medo só pode ser destruído se nos colocarmos nos braços do Pai, imitando Jesus e Maria”, enfatiza.

Vigini, ao analisar a obra de Carlo M. Martini, chega à conclusão que para vencer o medo da morte a fé torna-se um elemento essencial, por meio dela e, através da oração, nasce o abandono em Deus que infunde a necessária coragem para superar o medo, esperando com confiança o encontro com o Senhor.

Em breves palavras, o autor convida a meditar o sentido da morte: “Se nascer quer dizer que somos chamados a um destino eterno, morrer é ir ao encontro do cumprimento desse destino”, relata. Para Martini, esse momento vivenciado por inúmeras pessoas, compara-se a uma terrível noite escura, onde até mesmo a fé é colocada à prova. 

Todavia, embora o sofrimento e a incompreensão desse mistério gerem incertezas, experiências de vazio, aridez, desespero e impotência diante dessa situação, aonde se chega até acreditar no abandono total de Deus, no final de toda essa vivência, segundo ele, uma fenda de luz poderá penetrar até mesmo o quarto mais escuro e solitário do coração, e essa fenda leva a perceber que nem tudo está perdido,  se pode recomeçar e esperar.

No momento do luto, fogem-se as palavras e todos analisam sua conduta terrena e sua situação diante de Deus e dos irmãos. Perante a morte todos são iguais, não há rico ou pobre, etnias, trata-se de uma passagem que deverá ser trilhada por todos. Porém, a diferença de viver este processo com fé e mais confiança está na aceitação dos mistérios do próprio Deus ao nos prometer a salvação eterna.

A obra “Escatologia da pessoa: vida, morte e ressurreição – escatologia I”, também convida a refletir de forma teológica a realidade da morte. No volume, o autor Renold Blank desenvolve uma visão atual e contemporânea das experiências do homem na morte e além da morte.  Para Blank, fugir da reflexão sobre a morte significa fugir da reflexão sobre o ser humano. Para ele, é possível descobrir, atrás dos fatos, a presença do Deus vivo, que não quer a morte do ser humano, mas sua vida em plenitude.

Sobre a reflexão da morte é preferível pensar que, a única coisa que perece é apenas a matéria humana, as pessoas que amamos nunca morrem ou desaparecem completamente, pelo contrário, elas permanecem vivas em nossos corações e nas mais lindas recordações dos momentos vividos com intensidade e, por meio de seu legado. Que possamos nesta liturgia refletir a data com mais clareza e na certeza da ressurreição prometida pelo Deus amoroso e misericordioso.

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