Uma chance para a fé | Paulus Editora

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Catequese

17/09/2014

Uma chance para a fé

Por Solange Maria

A fé cristã sempre se assentou sobre o chamado de Deus à humanidade e sobre a resposta da humanidade ao seu Senhor.

O chamado de Deus não acontece no exterior daquele que o escuta, mas no mais íntimo do coração humano que, sendo transformado pela presença de Deus, é capaz de atender a seu apelo de amor.

Se, em outros tempos, a catequese se baseou na difusão de doutrina e dogmas ou na luta por melhores condições de vida, era porque entendia que o apelo do coração já estava, de alguma forma, respondido pelo meio cultural no qual se estava imerso ou pela abertura de todo ser humano a Deus, que o impelia para o transcendente e suas causas, numa espécie de humanismo cristão. O modelo catequético que resultou não só da cristandade mas também modernidade (Renovação Catequética) pressupunha a fé católica ativamente presente no catequizando.

Hoje, no entanto, bem longe de uma sociedade cristã, está nossa sociedade secular. E cada um de nossos contemporâneos vive bem distante daquele ser humano cheio de sonhos e projetos cristãos.

Nem a cultura é cristã, nem as pessoas são cristãs.

O Deus de Jesus Cristo se tornou um Deus-desconhecido, a quem a humanidade atual precisa ser apresentada.

Esta realidade, desafiadora e intrigante, não é má, nem coisa do diabo. É só um tempo com seus limites e possibilidades como qualquer outro.

Se a catequese quer ter chance hoje, deve ver as possibilidades incríveis que este tempo lhe proporciona.

O evangelho – que sempre foi força para viver – tem espaço garantido neste mundo turbulento, diversificado e plural. No momento em que nossas referências sociais, familiares e culturais tendem à ruína, o evangelho pode manifestar toda sua força. Para isso, primeiramente devemos reconhecer que não estamos só diante de um problema de método.

Não basta trocar o modo de dar catequese, mas é preciso rever a pertinência do que tem sido anunciado.

Nossa gente não busca mais uma religião pronta, que dê normas, regras e princípios doutrinários, mas um espaço para experimentar a força do amor que é própria do evangelho.

Mas como fazer isso? Bom, primeiramente teremos que rever nossos métodos, sempre tão absolutos, e reconhecer que a fé cristã não é mais uma herança cultural, mas uma proposta em meio a tantas outras.

O mundo plural hoje obriga a fé cristã a uma atitude de humildade.

Podemos propor a fé, mas é só o que podemos fazer. A fé cristã vai se impor, vai encontrar respaldo ou não na sociedade, apenas se ela for força para viver neste mundo conturbado e sem referências estáveis. Aliás, a instabilidade do mundo e das instituições não desfavorece o anúncio do evangelho, ao contrário ela o facilita. A boa nova de Jesus, seu amor desmensurado pelo mundo e sua proposta de amar sem medidas podem ser a força que muita gente procura, a razão para sua vida, tão marcadas pelo niilismo e pela falta de sentido. E parafraseando o Evangelho de Lucas, tendo a concordar com Karl Rahner, quando afirmou que “há mais alegria por um só cristão convertido, que de fato fez a experiência do encontro com Deus, do que por noventa e nove que receberam a fé como herança da cristandade”. Pensemos nisso!

1 comentário

18/9/2014

José Luiz Veld

Sim, uma chance para a catequese. Contudo, não sejamos ingênuos. O tal contexto plural atual é meramente aparente. Ademais, pluralidade de culturas sempre houve, mesmo em contextos de cristandade. Na cristandade a ideia de Deus ou seus correlatos unificavam os valores e fins da existência. Atualmente, há uma pluralidade cultural e de valores, mas a "transcendência" do mercado ocupa o lugar que era de Deus, e unifica os valores e fins da existência. Pluralidade, de fato, somente se o mercado for superado como o critério último de organização da vida, como ocorre hoje em dia. Walter Benjamin, Michael Löwy e Giorgio Agambem podem ajudar a problematizar a tese da pluralidade.