– José, José. Acorde José!
Era já madrugada quando Maria me despertou. Pressentia que era chegada a hora do menino vir ao mundo. Apressei-me em acomodá-la melhor e logo chamei Salomé, que dormia na parte inferior. Maria estava tão serena que não parecia uma mulher prestes a dar à luz. Olhava-me com ar paciente e a humildade de sempre. Pediu apenas algo sobre o qual apoiar a cabeça. Enquanto isso Salomé preparava algumas bacias, toalhas e água limpa para o parto.
Maria deu à luz o menino, seu filho e nosso filho. Salomé acomodou o menino nos braços da mãe, que não conteve as lágrimas. Então Maria agradeceu a Deus dizendo:
– Demos graças ao Senhor porque ele é bom. O seu amor é para sempre. Cantemos e louvemos seu poder e sua força. Cantemos louvores ao seu glorioso nome, pois ele fez em mim maravilhas! Suas obras são maravilhosas. Este é o dia em que o Senhor agiu; alegremo-nos e exultemos com ele. Louvemos o Senhor, com todo o nosso coração. Cantemos as suas maravilhas, pois eterno é o seu amor!
Eu passei todo o tempo do parto rezando, a alguns metros de Maria. Na nossa tradição não é permitido ao pai ou a qualquer homem acompanhar o parto, mas toda a nossa vida era exceção, começávamos a nos habituar a elas. Após ouvir o choro do bebê, me levantei e fui para junto de Maria. Enquanto Salomé limpava o local, eu contemplava minha amada esposa e o menino no seu colo. Todas as minhas preocupações desapareceram ao ver sua alegria de mãe que protege junto ao peito o filho recém-nascido. No meu coração sentia só alegria. Não havia espaço para o medo ou angústia. Foi a primeira vez que senti como realidade profunda a exortação do anjo: “Não tenha medo”. Poderia passar o resto da vida a contemplar aquela cena tão meiga e envolvente.
– Será assim para todas as mães ou esta noite é única? Sentirão todas as mães este milagre da vida, esta magia do parto? –, exclamou Maria, sorridente.
– Não sei, Maria. Mas acho que não é uma contradição, é complementaridade. Esta noite é única, especial, mas para todas as mães dar à luz é algo especial, único.
Com seu olhar materno, Maria cobre e aquece o menino. Que profundidade, que expressividade. Posso ler tantos sentimentos naquele olhar. O menino dorme, mas sinto que ele acolhe e agradece o olhar de sua mãe. Depois de alguns minutos Maria olha para mim. Sinto que dirige também a mim afeto semelhante ao que destina ao menino. Sem dizer palavra alguma, faz um simples movimento e compreendo que ela quer que eu também pegue no colo o menino. Hesito por um instante. Sinto que ele ainda está fisicamente ligado à mãe, como antes do parto.
Seu olhar se movimenta entre a contemplação da fragilidade do menino em seus braços e a minha hesitação eufórica. Percebo que é importante para ela partilhar esse momento de exultação. Caminho na sua direção. Salomé, que esteve sempre ao seu lado, dá um passo atrás pressentindo que aquele é um momento nosso, apenas nosso. Aproveita a ocasião para levar para fora a bacia e alguns panos usados no parto.
Aproximo-me de Maria e do menino, ajoelho-me diante deles. Delicadamente Maria passa o recém-nascido para o meu colo. Impossível descrever a sensação daquilo que se seguiu. Era como se tocasse o infinito, o eterno. Como se o tempo não existisse. Já não era noite, sentia-me como que envolto por uma grande luz. Luz que não vinha de um lugar específico, mas do meu interior. Brotava do mais profundo do meu ser. Não era uma luz que vinha do menino, era como se ele fosse a energia que me transformava em luz. Algo que brotava de dentro, iluminava a partir de dentro. Olhei para Maria e vi sua face delicada e radiante. No seu sorriso, sem precisar movimentar os lábios, compreendi que ela me dizia:
– Exatamente, você também está sentindo agora.
Também sorri, como que para confirmar:
– Sim, estou sentindo.
Não precisamos de palavras quando comunicamos com a alma.
Naquele momento compreendi que nada seria igual dali para frente. O menino é especial, é o Verbo encarnado, fará grandes coisas em todos os que o tocarem ou se deixarem tocar por ele. Beijei-o com ternura, embalei-o com movimentos suaves e elevei-o ao céu, agradecendo ao Senhor por tão grande dádiva. Juntos, Maria e eu entoamos um hino de louvor a Deus pelo nascimento do nosso primogênito.
Envolvido em panos, colocamos o bebê docemente no berço improvisado sobre a manjedoura dos animais. Tão frágil e ao mesmo tempo tão majestoso. Ficamos os dois ali, lado a lado, admirando o menino que dormia tranquilamente. Às vezes é melhor silenciar para poder contemplar plenamente o mistério que se revela. “O Senhor é bom para com aqueles cuja esperança está nele, para com aqueles que o buscam. É bom esperar em silêncio a salvação do Senhor”, diz a Escritura. O silêncio manifesta a plenitude de fé que alguém traz no coração e que orienta todos seus pensamentos e todas suas ações. Para discernir e compreender é preciso silenciar. Em um mundo demasiado ruidoso, barulhento, confuso, é essencial parar para escutar a voz de Deus. Quando Deus fala, o mundo deve calar e contemplar. E estávamos diante da Palavra de Deus encarnada. Contemplávamos o próprio Verbo feito homem, em forma de menino, deitado sereno numa simples manjedoura.
Não apenas Maria e eu estávamos em silêncio. Era como se todo o universo tivesse silenciado. Por um momento toda a criação estava imóvel, contemplando seu Criador que veio ao mundo, que se fez criatura humana. Silêncio profundo. A natureza repousava. Não se sentia nenhuma brisa, nenhum movimento das árvores, nenhum pássaro no céu, nenhum assobio do vento, nenhum mínimo sinal de movimento. A criação como que se inclinava para saudar o Criador presente no menino. E a noite se encheu de luz, na noite foi gerada a esperança. O medo deu lugar à alegria; as trevas, à vida.
O rosto de Maria irradiava paz, ingenuidade, bondade, graça. É difícil descrever. Olhar místico, de quem se sente segura por estar diante de um milagre, de algo extremamente especial, único. Por estar defronte a um ser que é ao mesmo tempo divino e humano. Nem Maria podia compreender o mistério na sua plenitude, mas seu olhar dizia que não era preciso compreender, era preciso sentir, acolher. Era preciso viver aquele momento plenamente, amar aquele ser plenamente: o Filho de Deus, seu filho, nosso filho. Como sombra do Pai Celeste, eu estava diante do messias. O menino é o Emanuel, Deus conosco, Verbo encarnado. Mas de que tipo de messias se trata? De que e de quem ele nos salvará? Haverá uma razão para o Senhor ter escolhido a nós para sermos os pais terrenos do seu Filho, espero um dia compreendê-la plenamente.
Sinto no ar perfume de lírio, o mesmo perfume intenso daquela noite em que recebi de Deus a missão de ser o pai do seu Filho. Agora o contemplo, tão frágil, tão inocente. Suas pequenas mãos parecem querer agarrar o mundo. Abrem e fecham à procura de tudo e de nada. Agarram o tempo, enlaçam sentimentos, capturam a atenção, minha e de Maria. Temos olhos apenas para esse pequeno ser que acaba de vir ao mundo, dado à luz para ser luz das nações. Os animais ao nosso redor parecem reconhecer a sacralidade desse instante. Permanecem imóveis, em silêncio quase contemplativo. Também eles são testemunhas de algo extraordinário. Que momento! Narrar me faz reviver cada segundo daquela noite. Noite única, inesquecível, cujos pormenores descreveria diversas vezes, sobretudo ao menino quando ele crescer. Que alegria enorme!
* trecho do livro “Simplesmente José” (Paulus Editora, 2021), de Darlei Zanon