Fatos jornalísticos: entre verossimilhanças e ficções | Paulus Editora

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29/08/2014

Fatos jornalísticos: entre verossimilhanças e ficções

Por Jakson F. de Alencar

Na concepção do positivismo da idade moderna, que marca a humanidade e suas ideias de conhecimento até hoje, fato é uma experiência sensível da realidade; a cada fato deve corresponder um dado possível, uma sensação, de modo que se poderia conhecer os fatos e a realidade exata e objetivamente como eles são. O empiricamente observável e verificado pela experiência seria indubitável.

O mundo dos fatos é ligado ao “estado de coisas” e os enunciados devem ter correspondência transparente com esse estado de coisas empiricamente comprováveis, com idêntica validade para todos os sujeitos.

No senso comum, o significado de fato inclui ocorrências e ações em geral, logo, incluindo o que se sabe sobre o caso por observação e experiência, mais que por inferência. Os dados reais da experiência são considerados as coisas existentes em oposição à ficção.

O jornalismo incorpora esse espírito do positivismo e o senso comum sobre os fatos, cultivando o “mito da neutralidade” e da “objetividade”. A ideia segundo a qual o jornalismo em sua “objetividade” funciona como uma espécie de espelho do real é histórica e muito arraigada na sociedade.

Há uma ideia implícita ou explícita de que, ao se ler um jornal, ali está a “verdade” dos fatos, seu retrato e espelho, e de que os textos descrevem-nos da forma mais fiel possível ao real, de forma empiricamente comprovável.

No mundo científico, após a crítica ao positivismo, sabemos que hoje, mesmo com todo o rigor, a objetividade total é impossível. A crítica feita pela filosofia e pelas teorias da ciência concluíram pela impossibilidade dos fatos de garantir o necessário rigor ao conhecimento. Com base nisso, há um dito espirituoso corrente, segundo o qual “os jornalistas seriam os últimos positivistas do mundo”. Essa estrita colagem dos fatos, sem maiores preocupações com a sua sobredeterminação histórica, enviesamentos, ideologias, subjetividades é típica da ideologia corporativa do jornalismo de extensão norte-americana, que influencia muito a cultura jornalística brasileira.

A imprensa traz consigo a ideia de liberdade de expressão e de defesa da cidadania e dos direitos, juntamente com a narrativa que constrói sobre si mesma como entidade mítica que administra a verdade dos fatos sociais, e mais, a retórica encantantória na narração fragmentária sobre a atualidade.

Sabemos, no entanto, que a notícia é elaborada em estratégias de construção do acontecimento. Os fatos podem ser não só transformados pela subjetividade de quem os narra, mas muitas vezes podem conter elementos de ficção. Na concepção do estudioso de comunicação Muniz Sodré, ainda que a ficção literária seja outra coisa, a construção jornalística tem proximidade e produz efeitos (numa escala diferente) análogos àqueles produzidos literariamente. Ao escolher um assunto, redigir um texto e editá-lo, os jornalistas e os veículos de comunicação em que trabalham, tomam decisões em larga medida subjetivas, influenciadas por suas posições pessoais, hábitos e emoções e também por seus posicionamentos de classe social, de política, de economia; necessidade de chamar atenção, de envolver o público, direcionamentos para as interpretações que esse público irá fazer, chegando até à falta de ética de distorcer os fatos e apresentar apenas as versões que interessam.

Portanto, ao se ler um jornal, ou assistir um noticiário, é fundamental estar atentos a essas formas de narrativas, aos direcionamentos subjetivos e ideológicos, fictícios presente nas narrações.

Não acreditar que ali a realidade está transparente tal e qual ela é. Bem como é fundamental exigirmos dos meios de comunicação que sejam o máximo possível objetivos, respeitando os diversos anglos nas narrações que fazem. E criar mecanismos legais para que os meios de comunicação desenvolvam sua atividade de maneira ética, democrática e pluralista.

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