Durante muitos séculos, a catequese tomou ares escolares. Trento e seu Catecismo dos Párocos, cuja elaboração ficou a cargo de Carlos Borromeu e sua equipe, deu boa contribuição nesse processo, quando fez da catequese uma atividade que combatia a ignorância religiosa da época, para evitar descaminhos do povo nos passos da Reforma Protestante. Vieram muitos outros catecismos que reforçaram essa ideia. Mas foi com o papa Pio X, que autorizou a comunhão eucarística para os infantes, que a catequese se especializou em crianças e virou curso preparatório para os sacramentos. Mérito teve Pio X quando, ao autorizar a comunhão para as crianças, mostrou que esse sacramento não é pão dos justos nem dos santos nem dos doutos, mas alimento para a vida de todo crente.
A Eucaristia, na época, mais adorada que manducada (manducar, verbo próprio para dizer do comer a ceia; literalmente “comer com as mãos”) foi de novo popularizada.
Convenhamos, porém, que a infantilização do processo catequético e sua escolarização têm até hoje seu preço. A catequese virou aula; o catequista virou professor de catequese (ou pior, de catecismo, em alguns casos); o catequizando virou aluno; a transmissão da fé virou um conjunto de conteúdos a serem ensinados; a experiência pessoal com o Ressuscitado foi reduzida a um montão de fórmulas da fé a serem apreendidas, assimiladas. E os sacramentos da iniciação cristã, que, no catecumenato, sinalizavam o processo de iniciação dos que na fé queriam fazer seu caminho de vida, foram ministrados sem a devida iniciação de fato. Fizemos os ritos iniciáticos sem a devida iniciação. Porque ensinar conteúdos não inicia ninguém; no máximo arranca da ignorância.
Aí o ato catequético virou aula mesmo. A organização da catequese copiou o modelo escolar; os catequizandos foram encaminhados para as diversas etapas dependendo do grau de escolaridade e do sacramento que recebeu. A catequese copiou a escola em tudo: passar matéria no quadro, decorar conteúdos, estudar as lições, fazer arguições e provas, provar que se tinha conhecimento da matéria dada, que se estava preparado para receber um sacramento…
Eis as exigências para receber os sacramentos. Os menos capacitados intelectualmente foram punidos; os que traziam dificuldade de aprendizagem ou os portadores de necessidades especiais no campo cognitivo ficaram excluídos. Não se mostravam esclarecidos o suficiente para receber a eucaristia.
E, no final do curso, os capazes eram premiados com o sacramento, com direito a festa de formatura, diploma de conclusão de curso, fotografia e tudo mais. A catequese virou aula; seu percurso virou curso preparatório para receber algum sacramento. A escolarização da catequese aconteceu em todos os sentidos: desde o espaço onde a catequese acontece, passando pelo ato catequético transformado em aula, até a organização segundo ritmos escolares. Mudar essa mentalidade vai levar tempos, mas não custa tentar. Pequenos esforços podem trazer grandes resultados.
Ótimo texto, Solange!
Muito interessante, professora Solange.
Seu texto me deixou realmente inquieta;fico muito preocupada com o despreparo dos catequistas e que talvez nem tenha ainda feito sua experiência pessoal com Jesus. Percebo que as crianças não gostam de ir à catequese e também ás missas.Nada é feito para motivá-los.Em casa, bronca dos pais que obrigam mas não dão o exemplo; como fazer acontecer o Reino se tudo é um grande "oba oba", catequese puramente sacramentalista não converte ninguém. Gostaria de aprender mais com você.