As distâncias e o tempo não foram abolidos como se diz | Paulus Editora

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Comunicação

15/05/2015

As distâncias e o tempo não foram abolidos como se diz

Por Jakson F. de Alencar

Algumas teorias sobre as novas tecnologias da comunicação, e sobretudo as crenças a respeito muitas vezes levadas à cabo por um certo “fanatismo das tecnologias” argumentam que os acontecimentos de qualquer parte do mundo se tornaram “simultâneos” para quaisquer outras partes, mesmo distantes, por meios das redes de comunicação. Com isso, se sugere que, por meio de nossos sentidos “estendidos” nós experimentamos eventos, tão longe quanto o outro lado do mundo, como se estivéssemos lá, no mesmo espaço físico. Por exemplo, assistindo a guerra do Iraque ou outra guerra pela televisão, pode-se ter uma visão similar a dos pilotos que acertam os alvos, parecendo que de fato é como estar lá.

Mas nós não experimentamos os acontecimentos em torno de nós apenas através de nossos olhos e ouvidos.

Há uma grande diferença entre assistir a uma guerra pela TV da sala ou estar lá no país bombardeado; ou mesmo na região desse país. As tecnologias da comunicação permitem a sensação de que os fatos foram trazidos para perto de nós, mas também nos permitem ficar a uma distância física segura; bem como há uma tendência de as pessoas que se comunicam por meio dessas tecnologias o fazerem de maneira que permite ficarem isoladas.

A informação instantânea em âmbito mundial também não é generalizada e veraz; não chega a todos e é mediada por um punhado de grandes empresas ocidentais que são os grandes atores desse suposto “tempo real”.

Não temos acesso aos fatos, mas à sua interpretação e nem todos são atores de fato em tempo real, mas espectadores.

Em um lugarejo o testemunho das pessoas que veiculam o os acontecimentos podem ser cotejados com a própria percepção real ou com o testemunho de outros vizinhos. No âmbito mundial e em sua complexidade, a interpretação já vem marcada pelos humores, visões, preconceitos, maquinações, interesse e ideologias das agências ou mesmo das pessoas que compartilharam.

Embora existam de fato as possibilidades e tendências de informação sobre acontecimentos de lugares diversos, alguns pensadores e também o senso comum exageram em algumas conclusões e previsões. Por exemplo, a conclusão de que o “espaço e o tempo foram abolidos”, embora haja certa sensação a respeito, também não pode se dar como fato consumado. Há imensas partes do mundo da qual a mídia na fala e da qual se sabe pouco, ou algumas informações fragmentadas e superficiais. E só podem experimentar a sensação de distâncias diminuídas para minorias que podem fazer caras viagens internacionais ou ter meios de comunicação de alta performance. Mesmo para esses as fronteiras, distâncias e tempo não foram totalmente abolidos.

Para o geógrafo Milton Santos a contração espaço e tempo não passa de mito. “De acordo com as possibilidades de cada um, as distâncias têm significações e efeitos diversos” (Por uma outra globalização, p. 19, 41). Mesmo que os dispositivos tecnológicos e telemáticos simulem o abatimento das fronteiras espaciais e dos limites do tempo e isso traga consequências às vidas das pessoas, não são as fronteiras das nações e das culturas que são propriamente abertas, mas trata-se de uma abertura virtualmente realizada do que é possível.

Não é propriamente uma experiência de acesso a qualquer lugar do mundo, é uma modalidade reticular e abstrata de experiência, um mundo em grande medida simulado.

Há também uma busca de uniformidade a serviço dos atores hegemônicos, unindo a tirania do dinheiro aliada a da informação, mas o mundo se torna menos unido, “tornando distante o sonho de uma cidadania verdadeiramente universal” (Milton Santos, Por uma outra globalização, p. 19, 28-29, 35, 39-40).

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